Fantasias

-Por favor, tem passagem para Sonholindo?
-Não senhor.
-Não tem mais passagem?
-Não, meu senhor. Não tem Sonholindo. Esse lugar não existe. Aqui tem passagem para Água da Mula, para São Pedro do Piquiri, Barrinhos, Redenção...
-Redenção!! Estou querendo passagem para Sonholindo e o senhor me oferece Redenção!!
-Não amigo, não estou oferecendo. Estou dizendo que existem passagens para esses lugares. O senhor compra se quiser. Agora, passagem para Sonholindo não tem.
-Não! Para outro lugar não quero. Eu quero mesmo é ir para Sonholindo. Falaram para mim que não fica longe.
-Mas o senhor sabe mais ou menos onde fica? Quem sabe o outro vendedor possa informar melhor.
-Bom... Sabe como é... as pessoas explicam e nem sempre a gente entende direito. Pelo que me falaram fica ao norte. Logo depois de Canaã a gente deve virar a direita. Assim que chegar em Passárgada, é seguir em frente. Está logo ali. Não parece longe, parece?
-Depende. Lugar que não existe não dá para dizer que é longe. Nem perto.
-Mas, sabe moço, eu não tenho preguiça nenhuma de procurar. Para dizer a verdade, eu estou tentando ir para lá desde sempre.
-Bom, eu já vi gente procurando passagem para cada lugar! Eu estou no ramo de vender passagens faz muito tempo. Mas esse lugar ninguém tinha procurado até hoje. 
-Pois deviam. Não sei por que esse lugar é tão desconhecido. Não era para ser. Só para o senhor saber, lá ninguém precisa trabalhar. Tudo é de graça. Caso você precise de uma casa, é só escolher. E tem mais, lá, pode acreditar, ouro não vale nada, nadinha. Sabe porque? Porque tem ouro brotando no chão. Eu mesmo conheci um que rastelava ouro no fundo do quintal e tentou vender. Ninguém comprou porque todo mundo tinha à vontade. Além disso...
- Mas, Ô meu amigo. Não adianta me contar essas histórias, porque não tenho passagem mesmo. Pode ser um lugar maravilhoso, mas não tenho como levar o senhor até lá.
-Mas, olha, agora assim olho no olho. Você não gostaria de ir até lá?
-Claro! Se de fato for como o senhor fala...
-E é!
-Mas eu duvido. Duvido e faço pouco. Lugar que ouro não vale e não precisa trabalhar... O senhor vai procurar passagem para lá o resto da vida.
-Pois eu digo mais para o senhor. Não só não precisa como é proibido trabalhar. O que você precisa ou sonha é só dar alguns passos e está lá o que se deseja. Para o calor, sombra e água fresquinha jorrando das quedas d’água. Muito frio? Casa aconchegante com lareira e tudo.
-Sei.
-Sonholindo tem o tamanho do seu desejo.
-Sei.
-E daí, vamos?
-Ah! Não posso. Tenho que vender passagens. O emprego não é lá essas coisas, mas garante o fim do mês, né? E se eu não achar esse tal de Sonholindo?
-E daí? Pelo menos a gente procura. Eu mesmo estou procurando faz uma vida e não paro por nada.
-E se não achar?
-O gosto está na procura, rapaz!
-Não é que eu não queira... Esse empreguinho aqui está bem chato... Mas eu nunca gostei de me arriscar, o senhor entende, né?
-Entendo, mas não concordo. O que você está ganhando aqui? Não tem risco, mas também não tem prêmio. Vou te perguntar pela última vez. O que você ganha ficando aqui?
 (Pausa)
-Zézinhooo, vê se assume esse guichê aqui que eu estou tendo de sair.
-!!!!!???!!!
-Como assim, não posso. Tanto posso que já estou de saída. Se alguém perguntar diz que vou procurar passagem para Sonholindo.
-!!!!!?????
-Fui!


Acadêmico Marco Antônio Fabiani
Médico e escritor

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