Extratos da reunião de 14/10/2018

Mesa diretiva: da esquerda para a direita os Acadêmicos Fátima Mandelli (Secretária),
Sergio Alves Gomes (nosso Orador) e Dinaura G. Pimentel Gomes
(a palestrante do dia)

Leitura do Credo Acadêmico, por
Julio Ernesto Bahr

Nosso Mestre de Cerimônias, Jonas Rodrigues de Mattos,
conduziu as apresentações



Um mundo melhor começa comigo!
Pilar Alvares Gonzaga Vieira

Com frequência, ouvimos comentários, nos dias de hoje, no sentido de que grande parte das nações e das pessoas do mundo, encontram-se em um estado de intensa inquietação mental e física em uma intensidade jamais vista durante séculos; nos parece que o mundo encontra-se em um estado mental confuso, e que isto gera infelicidade, misérias e retardamento do progresso, sob todas as suas formas.
De todas as expressões culturais que o homem tem promovido, com certeza a religião e a filosofia são as maiores e as de resultado mais amplo. A religião e a filosofia, a ligação mais íntima do homem com a verdadeira sabedoria, representam o que poderíamos chamar de produtos mais seletos da realização cultural do indivíduo. Nelas encontramos a mais pura expressão do sentimento e a razão com o devido equilíbrio, sentimos a mais plena manifestação das potencialidades do homem. Nesse equilíbrio, temos a clareza da vida dos seres humanos se encaminhando para um fim determinado.
O homem tem dado provas de realizações humanas, de muitas formas. Deveremos, entretanto, compreender que a filosofia e a religião são os meios pelos quais o ser humano pode se transmutar, do ser físico que normalmente é, em ser divino que é potencialmente, ou poderemos dizer, o indivíduo pode se transmutar de homem em deus.
Vivemos numa era de materialismo, porém esta não é uma situação nova. O materialismo já foi a filosofia dominante na sociedade humana.
Os valores mais significativos da vida estão sendo ameaçados de todos os modos possíveis; apesar da ciência e da física terem feito conquistas que influenciaram no desenvolvimento do domínio do meio ambiente, há no momento preponderância da natureza animal se expressando nas atividades humanas em todo o mundo.
Este fato explica, em parte, porque há tanta discórdia e miséria, tantos conflitos ideológicos, grupos doutrinários opostos em pensamento na religião, e facções políticas antagônicas em quase todas as sociedades humanas. O homem vê a civilização ameaçada por forças sobre as quais ele nenhum controle tem, e vive em maior temor do que é coerente com as realizações da civilização da qual faz alarde no momento.
Poucos negam que o mundo necessita de uma reafirmação de valores espirituais que têm sido fomentados e sustentados pelas grandes religiões e sistemas filosóficos que surgiram em vários períodos da história da evolução do homem. Se essa reafirmação dos valores espirituais puder ser combinada com a utilização das descobertas das ciências modernas, o homem então terá dado um grande passo a frente em seu processo evolucionário.
Mais do que qualquer outra coisa, o homem necessita de coordenar todos os recursos da civilização e todas as realizações de seu pensamento.
Necessitamos de harmonia e coordenação entre todas as realizações do homem. O homem precisa de uma filosofia de ciência e de uma ciência de filosofia, uma equilibrando a outra. Assim, a maior contribuição que o homem pode prestar a esta era (esta moderna era a que nos referimos como século XXI) é a coordenação do conhecimento existente, a qual tem que ser concluída pela reafirmação, por parte do homem, de seus verdadeiros valores e de sua verdadeira relação para com o Divino e, pela sua cooperação com as conquistas da ciência.
Pela combinação de todas as forças culturais e científicas do homem e pela associação dessa combinação com seu discernimento espiritual e as potencialidades psíquicas, terá o homem dado um grande passo para a compreensão final de seu destino e de seu devido lugar no universo.
No momento, a inquietação em todo mundo em questões espirituais, políticas e financeiras é, de muitas maneiras perturbadoras, porém, tratam-se de perturbações construtivas, que muito se assemelha a demolição para que se possa erigir uma nova construção. Demolimos velhos conceitos para incrementarmos os novos que nos trarão mais conhecimentos para melhor lidar com a vida e as pessoas.
Isto é verdade quanto ao mundo atual. As nações podem estar brigando umas com as outras, exigindo, isto, aquilo, e outras coisas mais, que, em sua maior parte, não obterão, entretanto, dessa agitação dessa lista e dessa inquietação, muitas coisas mais construtivas nascerão, muitas das quais, talvez não se venham a manifestar nos cem anos seguintes.
Nada há mais retrógrado, mais prejudicial ao progresso do homem, individual e coletivamente, do que uma atitude de absoluta satisfação.
O progresso de uma nação e dos indivíduos que a compõem dependem da busca incessante de conhecimento contínuo para a formação de uma sociedade politizada e consciente de seus deveres e obrigações recíprocas. 


A artista plástica Marlene Pedalini Bórmio abrilhantou o Momento de Arte apresentando três das suas obras, pinturas a óleo sobre telas. Marlene frequenta o atelier de arte de nossa Acadêmica Saide Maruch. Reproduzimos as três obras a apresentadas:





 
O Que Aprendi com a Depressão
Jan Luiz Lluesma Parellada *

A exemplo de tantos dilemas, há duas notícias sobre a depressão, uma boa e outra ruim.
A boa é que a probabilidade de sofrer de depressão é de 30%, em outras palavras, 3 de cada 10 pessoas sofrerão pelo menos uma crise de depressão durante a vida, logo 70% passarão impunes por ela. Não sei quanto a você,  mas considero 70% de chance de não experimentar os terríveis sintomas de uma crise de depressão um número muito bom.
A notícia ruim é que, considerando que cada um dos deprimidos afete seriamente a vida de pelo menos uma pessoa muito próxima, cônjuge,pais e filhos em especial , a equação final resultará em 60% de vidas abaladas pela doença.
A minha experiência pessoal foi marcada por 4 crises da doença que repetiram-se em intervalos regulares de 10 anos, ou seja, uma depressão por década dos 17 aos 52 anos. A pior crise foi a primeira, não fazia a menor ideia do que estava acontecendo, eu era um jovem saudável, cursando com sucesso o segundo semestre do curso de Agronomia na Universidade Estadual de Londrina, quando um pesadelo inimaginável  bateu na minha porta. A verdade é que ninguém, nem os profissionais de saúde mental da época, conseguiram disgnosticar o episódio depressivo, diferente do que ocorreu em maio de 2014, quando a doença voltou de forma totalmente inesperada porém nítida, aos meus 52 anos de idade, durante uma bela viagem de turismo a Buenos Aires.
Tratando-se de uma doença emocional, me parece óbvio que a depressão não surja do nada, e esconda, “sempre”, algum evento marcante por trás de cada episódio. O grande problema é a frequente dessincronia entre um provável trauma e a ocorrência da crise depressiva. Digo, provável, porque conheço casos, inclusive o meu, onde não é possível identificar nenhum trauma insuperável, alguma tragédia, que pudesse justificar a severidade inacapacitante dos sintomas de um episódio depressivo, os quais, no meu caso, ocorreram em épocas inusitadas da minha vida.  Em 2014, eu tinha um bom casamento, um bom emprego, ótimos filhos, pais e irmãos saudáveis, e nada disso impediu que o “gatilho” da depressão fosse disparado.
Diante de tal paradoxo, adotei  como uma questão fundamental para minha sobrevivência com dignidade, decifrar a doença e desenvolver estratégias para combatê-la . Como elas funcionaram, há cerca de 2 anos encontro-me melhor do que nunca,  resolvi descrever essa experiência na obra “O Que Aprendi com a Depressão” , publicando-a em outubro de 2018. A minha esperança é de que o conteúdo do livro possa ser de grande utilidade, tanto para as vítimas da depressão quanto para aqueles que sofrem ao lado deles.
*Escritor, autor de vários livros
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Um bourbon para Faulkner
Acadêmico Marco Antonio Fabiani

O Acadêmico Marco Antonio Fabiani fez uma breve apresentação anunciando seu novo livro, a ser lançado em Londrina no próximo dia 23 de outubro.
A narrativa do livro se inicia no dia 8 de agosto de 1954, um domingo nublado, quando William Faulkner, um dos maiores escritores norte americanos desembarcou em São Paulo. Um homem baixinho, encrenqueiro e beberrão, que passaria uma semana no Brasil, participando do Congresso Internacional de Escritores. Ou, pelo menos deveria participar. Pisou em solo brasileiro com a incumbência de fazer a aproximação cultural entre as Américas. Tudo certo, se ele não fosse o senhor Faulkner. Se ele, um gênio literário, não tivesse aversão a rapapés e conversas tediosas sobre literatura. 
O escritor não foi ao Congresso. Durante as noites foi ao bar do Esplanada Hotel e travou uma inesperada amizade com o garçom João Clark, ele um descendente de americanos que chegaram ao Brasil logo após a Guerra da Secessão.
Esse é o fio condutor do romance “Um Bourbon para Faulkner.” A história mistura fatos históricos com personagens e situações ficcionais, onde a relação de Clark e Faulkner (Bill, como ele prefere ser chamado) impacta a vida de ambos. Ao mergulhar na memória das famílias, emerge um passado comum, pontuado por guerra, paz e superação.
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XIII Encontro das Academias de Letras, Ciências e Artes do Paraná
A Acadêmica Fátima Mandelli trouxe informações sobre o próximo Encontro das Academias do Paraná, que se realizará de 22/11a 24/11 em Maringá, convidando nossos Acadêmicos a participarem - assim como participamos em edições anteriores.
A programação incluirá palestras, oficinas literárias, show com o artista Arnaldo Antunes e a premiação dos concursos literários da cidade, além da eleição da nova diretoria da Associação das Academias de Letras, Ciências e Artes do Paraná.
Maiores informações serão enviadas aos nossos Acadêmicos.



Direitos Fundamentais consagrados pela Constituição Federal de 1988 e o retrocesso civilizatório espelhado na recente Reforma Trabalhista 
Acadêmica Dinaura Godinho Pimentel Gomes *

O trabalho é tão antigo quanto o homem. Entretanto, o Direito do Trabalho é uma criação recente, porque, na antiguidade clássica, prevalecia o menosprezo pelo trabalho humano. 
Trata-se de um Direito de conquista, o que vem demonstrado por uma rápida retrospectiva histórica, cumprindo ressaltar, antes de tudo, que o regime escravagista no Brasil foi abolido apenas há 130 anos.
Mesmo nas sociedades ideais dos filósofos, na república platônica e na política aristotélica, o trabalhador, submetido à escravatura, permanecia à margem da vida como objeto de propriedade de alguém e jamais visto e reconhecido como pessoa.       
Na Idade Média, predominou o trabalho agrário, de servidão à gleba. Mantinha-se a subordinação pessoal e total dependência do trabalhador camponês ao senhor feudal, o era transmitido de geração a geração. 
Somente após as Revoluções Liberais dos Estados Unidos, em 1776, e da França, em 1789, decorreu o declínio do absolutismo e deu ensejo à formação do Estado Liberal Primitivo. 
Entretanto, o sistema político e jurídico do Estado Liberal foram organizados apenas em função da salvaguarda dos direitos civis e políticos, voltados à garantia do exercício da liberdade e da igualdade de uma sociedade de proprietários. 
Esse modelo de Estado propiciou a formação do capitalismo industrial, quando se estruturou a relação basilar desse sistema de produção capitalista, a relação de emprego. Deu origem à classe operária e a liberdade econômica sem limites com opressão dos mais fracos. Permitiu-se a fixação de salários ínfimos, jornadas desumanas e condições de higiene degradantes.
A passagem do Estado Liberal para o Estado Social rendeu ensejo à reformulação do papel do Estado, passando a ser necessária sua intervenção nas questões sociais e no modo de produção capitalista.  
Dá-se assim a passagem do Estado Liberal para o Estado Social, mediante a reformulação do papel do Estado, inclusive para salvar o próprio capitalismo. A intervenção do Estado na organização e direção do processo econômico, passa a assegurar a proteção das grandes massas da população, mediante a devida regulamentação do trabalho, garantindo direitos, condições mínimas de trabalho e de vida dos trabalhadores. 
É assim que, em face da formação de uma consciência coletiva, jungida ao sentimento de solidariedade, emerge o Direito do Trabalho. Tem por fim dar equilíbrio à principal relação formada por forças capitalistas, mediante uma legislação predominantemente imperativa, de força cogente e irrenunciável pelas partes.       
O Estado Democrático de Direito, que temos hoje, superou as duas marcas do anterior constitucionalismo. Emergiu do processo de transformação política, econômica, social, cultural e jurídica, a partir dos finais da Segunda Guerra Mundial, principalmente como resposta às atrocidades da Era Hitler, através da instituição de normas  de Direito Internacional de Proteção dos Direitos Humanos, no âmbito global.         
Os valores jurídicos do Estado Democrático de Direito revelam-se em torno da pessoa humana. A dignidade humana vem erigida como a viga mestra dos direitos fundamentais e o trabalho humano passa a ser reconhecido como valor social, tal como estabelecer a Constituição da República Federativa do Brasil, em vigor desde 05 de outubro de 1988, em total sintonia com os Tratados Internacionais dos Direitos Humanos.
Nesse contexto democrático, o trabalho, portanto, assume o caráter de ser o mais relevante meio garantidor de um mínimo de poder social da grande massa da população, que é destituída de riqueza. Assim, não se pode instituir democracia sem um correspondente sistema econômico social que valorize o trabalho humano.
Em sintonia, eis o que estabelece de forma imperativa, o art. 170: “a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da Justiça Social”.
A finalidade do Direito do Trabalho consiste justamente em equilibrar essa relação assimétrica do sistema capitalista de produção desprovida, em sua origem, de igualdade econômica e social, em face do poder diretivo e disciplinar do empregador. Para tanto, concede à parte mais fraca e juridicamente subordinada – o empregado - garantias e vantagens, por meio de normas protetivas e de caráter imperativo, em vista da realização da Justiça. Com isso, esse ramo do Direito democratiza a relação de emprego inspirado no princípio da igualdade jurídica em sentido material. Nesse contexto de plena evolução de reconhecimento e eficácia dos direitos sociais fundamentais -  dentre os quais, os direitos dos trabalhadores -  a recente Reforma Trabalhista introduz, no ordenamento brasileiro, novas regras voltadas, não raro, à satisfação de interesses patronais tendentes à redução de custos e ao consequente aumento de lucros, através da flexibilização de direitos e normas trabalhistas. 
Como se vê, o Direito do Trabalho é, de fato, um direito de conquista. Sua finalidade consiste trazer equilíbrio nessa relação assimétrica do sistema capitalista de produção.  Com isso, esse ramo do Direito democratiza a relação de emprego inspirado no princípio da igualdade jurídica em sentido material. 
Princípios que informam o Direito do Trabalho, seu próprio embasamento, como diretrizes para o legislador e para a interpretação no âmbito jurisdicional pertinente: 
1. Princípio de Proteção;
     1.1 Princípio da norma mais favorável; 
     1.2 Princípio in dubio pro operario; 
     1.3 Princípio da condição ou cláusula mais benéfica;
     2. Princípio da imperatividade das normas trabalhistas;
     3.Princípio da irrenunciabilidade de direitos trabalhistas;
     4. Princípio da inalterabilidade contratual lesiva;
     5. Princípio da irredutibilidade salarial;
     6. Princípio da primazia da realidade sobre a forma;
     7. Princípio da continuidade da relação da emprego.
No seio do Estado Democrático de Direito, constitui impostergável tarefa dos poderes públicos competentes, à luz da Constituição Federal, estabelecer diretrizes para o exercício da atividade econômica tendentes à formalização de uma ordem futura capaz de garantir, eficazmente, o direito à vida com dignidade.  E é por meio do trabalho decente que a maioria das pessoas se torna incluída no âmbito social e econômico, em  condições de  traçar seu próprio destino, no pleno exercício de sua autonomia e cidadania.
Nesse sentido, o Direito do Trabalho vem conceituado como conjunto de princípios, regras, valores e instituições aplicáveis de forma cogente à relação de trabalho. Todavia, a recente Reforma Trabalhista - Lei n.13.467, de 13 de julho de 2017 - ao introduzir modificações e novos artigos à Consolidação das Leis do Trabalho e em leis específicas, rompe com a principiologia humanística e social, objeto de conquista há séculos, no sentido de se manter a centralidade de toda pessoa,  no Ordenamento Jurídico, em prol da defesa da dignidade humana e do acesso ao trabalho decente. 
Como se vive em uma sociedade de trabalho, forçoso é valorizar sobremaneira o trabalho humano, principalmente diante das reformulações introduzidas pela utilização de tecnologias digitais associadas a técnicas de automatização. Nesse contexto, o desenvolvimento econômico e social do país depende basicamente da educação de qualidade, em vista da necessidade de acesso à qualificação da mão de obra. 
Entretanto, a nova lei, em seus artigos inseridos na Consolidação das Leis do Trabalho, ao estimular a terceirização trabalhista – que é uma das formas de flexibilização –  impossibilita a necessária capacitação permanente em favor de todo trabalhador:
Art. 4o-A. Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução. 
§1o  A empresa prestadora de serviços contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realização desses serviços. 
Nesse contexto, causa perplexidade o fato de a nova lei autorizar a toda e qualquer empresa, sem qualquer distinção, a terceirização de suas próprias atividades essenciais, o que poderá conduzir empresários a concentrar as finalidades de seus empreendimentos na obtenção do aumento das margens de lucro. 
Para os trabalhadores, essa estratégia da terceirização igualmente afronta o princípio da dignidade humana, bem como afronta o princípio da progressividade social, pois desconecta o empregado da empresa e o afasta de quem desenvolve a mesma profissão. Um terceirizado pode, assim, diante das flutuantes necessidades do mercado, exercer num curto espaço tarefas que não têm a menor identidade uma com a outra. As Carteiras de Trabalho dos terceirizados são a melhor prova de que eles, sem pouso, saltitam entre construtoras, restaurantes, bancos, condomínios, magazines, supermercados e outros tantos estabelecimentos, como se estivessem a demonstrar, até não mais poder, que a sua instabilidade profissional produz isolamento e enfraquecimento sindical com evidente violação da progressividade social. 
A questão mais estarrecedora diz respeito à rotatividade desmesurada dos trabalhadores a enfraquecer o exercício de sua cidadania. 
Justamente para equilibrar a relação de emprego, o Direito do Trabalho limita os poderes diretivo e disciplinar do empregador em prol da realização do ideal de justiça, justamente para compensar as desigualdades iniciais. 
Nesse cenário, a Reforma Trabalhista de 2017 desnatura o próprio Direito do Trabalho, ao desconsiderar um de seus princípios basilares, o princípio de proteção, que se refere ao critério fundamental que orienta o Direito do Trabalho pois este, ao invés de inspirar-se num propósito de igualdade, responde ao objetivo de estabelecer um amparo preferencial a uma das partes: o trabalhador. Enquanto no direito comum uma constante preocupação parece assegurar a igualdade jurídica entre os contratantes, no Direito do Trabalho a preocupação central parece ser a de proteger uma das partes com o objetivo de, mediante essa proteção, alcançar-se uma igualdade substancial e verdadeira entre as partes.  
Entretanto, a lei de Reforma Trabalhista desconsidera o princípio de proteção e o princípio da igualdade em sentido material. Facilita a celebração de acordos individuais entre patrão e empregado sem a garantia de participação do sindicato da categoria dos trabalhadores, vulnerando os limites traçados pelo art. 7o, incisos VI, XIII e XIV, da Constituição Federal:
Art. 59-A.  Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação.
Exsurge daí a faculdade de celebração de acordo individual entre as partes, para o cumprimento de uma jornada de doze horas, inclusive ininterruptas, no regime de compensação, apesar do que dispõe a norma estatuída no artigo 7º, inciso XIII, da Constituição da República Federativa do Brasil: “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho [...]”.  
A nova lei permite também a não concessão de efetivo intervalo intrajornada (ao prever a possibilidade de indenização), em total prejuízo à saúde do empregado. Com isso, desrespeita expressamente as normas de saúde e segurança do trabalho. Muitos dos danos à saúde de empregados são causados por força da exorbitante prorrogação da jornada normal de trabalho. Isto faz com que o trabalhador seja colocado em situação de maiores riscos. Mesmo assim, a Lei afronta as normas de proteção do trabalhador no ambiente de trabalho. 
Exsurge do teor dessa regra total desrespeito à norma do art. 7º, inciso XXII, da CRFB, a impor a redução de riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Isso porque a nova lei admite, expressamente e de forma generalizada, exorbitante jornada de 12 horas de trabalho, em regime de compensação, inclusive sem prévia licença por parte das autoridades competentes em matéria de higiene do trabalho. 
Indubitavelmente, a lei em questão subverte o princípio de proteção ao conceder significativa prevalência ao poder diretivo do empregador, no âmbito da assimétrica relação de emprego. É o que também estabelece no art. 484-A, da CLT:
“O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e empregador, caso em que serão devidas as seguintes verbas trabalhistas:  
I - por metade: 
a) o aviso prévio, se indenizado; e 
b) a indenização sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, prevista no § 1o do art. 18 da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990;  
II - na integralidade, as demais verbas trabalhistas. 
§ 1o  A extinção do contrato prevista no caput deste artigo permite a movimentação da conta vinculada do trabalhador no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na forma do inciso I-A do art. 20 da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990, limitada até 80% (oitenta por cento) do valor dos depósitos.  
§ 2o  A extinção do contrato por acordo prevista no caput deste artigo não autoriza o ingresso no Programa de Seguro-Desemprego”.
Diante desses destacados dispositivos legais  – dentre muitos outros, poderá o empregador forçar seu empregado a externar uma inexistente  autonomia de vontade para celebrar cada um desses acordos, mesmo em seu prejuízo, principalmente quando prejudicial à sua saúde, em razão de sua subordinação jurídica. 
No Brasil, são elevados os índices de exclusão social fomentados pelo desemprego e pela deficiente educação, nos mais diversos níveis. Tal situação se agrava pelos efeitos de uma globalização econômica direcionada a conduzir o mercado livremente em escala planetária, além das fronteiras territoriais dos Estados-nação. Favorece a concentração de riquezas, eleva o grau de desigualdade social e a vulnerabilidade de milhões de pessoas desprovidas de poder e riqueza, principalmente diante da escassez de postos de trabalho.
À luz dos direitos humanos e fundamentais, tornou-se imperativo salvaguardar o acesso ao trabalho decente a toda e qualquer pessoa, como um dos necessários meios de se prover o direito à vida com dignidade e garantir o pleno exercício da cidadania. Para tanto, incumbe ao Estado Democrático de Direito, como o principal agente transformador da realidade social, impulsionar o desenvolvimento econômico sempre em vista do fortalecimento dos direitos fundamentais sociais e da promoção do bem de todos. 
Contrapondo-se às finalidades da Ordem Econômica traçadas no art. 170, da Constituição da República Federativa do Brasil, verifica-se que a Reforma Trabalhista introduzida pela nova lei, em muitos aspectos, faz prevalecer o poderio econômico na relação de emprego, afastando a imperatividade de normas de proteção do trabalhador, inspiradas no princípio da igualdade em sentido material, afrontando o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da valorização do trabalho humano - além de normas internacionais de proteção dos direitos humanos. E, nesse cenário, desnatura o próprio Direito do Trabalho.
Resta ao Poder Judiciário Trabalhista desenvolver cada vez mais seu trabalho hermenêutico, para constituir a norma a ser aplicável ao caso concreto em vista da realização da justiça. 
O Juiz, diante do caso concreto e por meio da interpretação e aplicação do direito vigente, vincula-se tão somente à Constituição Federal e às leis que estão em harmonia com esta. Assim, deve negar aplicação às que repute inconstitucionais.  Tudo de modo a propiciar a concretização de direitos humanos e fundamentais, como valores supremos e humanistas da Ordem Jurídica vigente, que não tolera a prática dominante do economicismo.  

* Dinaura Godinho Pimentel Gomes. Pós doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica - PUC-SP. Doutora em Direito do Trabalho e Sindical pela Universidade Degli Studi di Roma - LA SAPIENZA, com revalidação do diploma pela Universidade de São Paulo – USP. Pós-Graduada em Economia do Trabalho - Curso de Especialização pela UNICAMP. Magistrada do Trabalho (9ª Região- PR). Membro Titular da Academia Paranaense de Direito do Trabalho. Membro Titular da Academia de Letras, Ciências e Artes de Londrina.  Professora Universitária



Para finalizar a reunião, o Acadêmico Sergio Alves Gomes, Orador da ALCAL, ressaltou alguns pontos dos conteúdos apresentados para introduzir citações à reflexão sobre o valor da singularidade de cada pessoa e o quanto este valor é menosprezado por todas as formas de totalitarismo, de tirania. 
Relembrando as palavras da Presidente Pilar Álvares Gonzaga Vieira, na abertura da reunião, frisou o Orador  que, no momento atual, é preciso perceber a presença da miséria, dos desequilíbrios e dos excessos que se expressam de várias formas, na sociedade contemporânea e lutar, racionalmente, contra tais atitudes destrutivas e tirânicas.  Citando HERÁCLITO (filósofo pré-socrático, natural de Éfeso, Ásia Menor, hoje Turquia, que viveu, por volta de 544 a.C-474 a.C), lembrou que, conforme importante ensinamento deste pensador, “mais do que o incêndio é necessário apagar a híbris” (desmedida, excesso). Lembrou também que, conforme ensinamentos de PLATÃO (diálogo Protágoras), a expressão “nada em excesso” estava gravada no templo de Delfos, como máxima a ser respeitada por todos, como indispensável virtude.  Na sequência, citou trechos da obra “O Valor de Ter Valores” (Petrópolis/RJ: Vozes, 2015) -  do professor e escritor  espanhol  FRANCESC TORRALBA  - referentes ao “valor de ser singular”, lembrando que a singularidade de cada pessoa deve ser respeitada, valorizada e promovida. E isso é o que se propõe fazer uma sociedade autenticamente democrática, por meio do Estado Democrático de Direito, o qual adota como um de seus princípios fundamentais, o respeito e a promoção da dignidade humana, presente em todo ser humano. 
Diz TORRALBA: “A singularidade é um dom, mas também uma conquista. Ao nascermos, ainda não o conquistamos. Vivemos um tempo que foge ao nosso controle, não o dominamos. Não sabemos quantas primaveras viveremos nem quantos natais celebraremos. A incerteza nos acompanha sempre, do nascimento até a morte. Uma natureza singular, única, irreplicável na história nos é concedida. Esse é o valor supremo do nascimento. Em cada nascimento, irrompe na história da humanidade uma personalidade nova, única, que não é mera extensão de seus progenitores nem cópia de seus irmãos. [...] Quando dizemos que todo ser humano é singular, estamos afirmando que ele é único e que ninguém mais poderá substituí-lo na história. [...]A singularidade é o que dignifica o indivíduo, o que o torna extraordinariamente valioso, a tal ponto que podemos denominá-lo, como o faz Max Scheler, valor fundamental. É por ser única que sua existência no mundo é tão valiosa e justamente por isso é preciso velar por sua vida e tratar com cuidado a sua presença. Se fosse a réplica de um modelo, a mecânica reprodução de um protótipo, o plágio de um arquétipo, seu valor seria relativo, mas sua unicidade lhe confere um valor singular.[...] Ser singular é um valor, é a base e o fundamento do diálogo, da essência da comunidade, da riqueza de um povo, de uma nação. Nascemos como seres singulares, mas podemos viver como clones. A singularidade é um dom, mas também um dever, pois só nos tornamos plenamente singulares quando não  negamos o que somos, quando reivindicamos esta singularidade e a expressamos no mundo em que vivemos. O medo de sermos autênticos, de sermos criticados, marginalizados, acaba nos levando a descuidar da própria singularidade. Consequentemente, vestimos uma máscara ao sairmos de casa e fazemos isso com tanta frequência que um dia nem sequer nos lembramos que éramos indivíduos singulares, destinados a sermos únicos neste mundo”.
Após tal citação, o Orador ressaltou que, conforme comprovado pela história, os regimes políticos tirânicos  menosprezam o valor da singularidade em favor da massificação das pessoas e as transformam  em objeto de serventia de seus  próprios tiranos. A respeito do tema “tirania”, lembrou, primeiramente, das leituras já realizadas, na ALCAL pela Acadêmica  Ludmila Kloczak , de trechos da obra “Sobre a Tirania” (São Paulo, Companhia das Letras, 2017), de TIMOTHY SNYDER  (da Universidade de Yale-USA). Em seguida, agregou citações da clássica obra “Discurso da Servidão Voluntária”, do pensador francês ETIENNE DE LA BOÉTIE (século XVI). Para este, “há três tipos de tiranos: uns obtêm o reino por eleição do povo; outros pela força das armas, outros por sucessão de sua raça”.
Do mesmo autor, foram lembrados seus ensinamentos sobre a AMIZADE e a CUMPLICIDADE. Citações que convidam à reflexão sobre o comportamento não apenas sobre o tirano mas também sobre os que se unem para a prática do bem  e, especialmente, sobre aqueles que formam bandos de assaltantes para atacar os cofres públicos e deles se apossarem do dinheiro arrecadado dos contribuintes, valor este que deveria  ser aplicado na realização do “bem comum”, ou “bem de todos”, conforme estabelecido na Constituição do Estado Democrático de Direito (CF, art. 3º, IV). Tais criminosos, ao invés do bem, praticam o mal que atinge toda a sociedade. Diz LA BOÉTIE: “ [...] que o tirano nunca é amado, nem ama: a amizade é um nome sagrado, é uma coisa santa; ela nunca se entrega senão entre pessoas de bem e só se deixa apanhar por mútua estima; se mantém não tanto através de benefícios como através de uma vida boa; o que torna um amigo seguro do outro é conhecimento que tem de sua integridade; as garantias que tem são sua bondade natural, a fé e a constância. Não pode haver amizade onde está a crueldade, onde está a deslealdade, onde está a injustiça; e entre os maus, quando se juntam, há uma conspiração, não uma companhia; eles não se entre-amam, mas se entre-temem; não são amigos, mas cúmplices”. E, mais adiante, o filósofo lança uma inquietante pergunta para nossos dias atuais: “Não é, portanto, uma lástima que, vendo tantos exemplos notórios, vendo o perigo tão presente, ninguém queira aprender à custa de outrem e que tanta gente de tão bom grado se aproxime dos tiranos?”  
Por último, o Orador Sergio Alves Gomes relembrou o importante convite feito por La BOÉTIE a todos os seres humanos:
“Aprendamos pois uma vez, aprendamos a fazer o bem; levantemos os olhos para o céu ou para nossa honra e para o próprio amor da virtude; ou, para falar cientemente, para o amor e honra de deus (sic) todo-poderoso que é testemunha segura de nossos feitos e juiz justo de nossas faltas. De minha parte creio, e não estou enganado, que lá embaixo ele reserva à parte para o tirano e seus cúmplices alguma pena particular – pois nada é mais contrário a deus (sic), de todo liberal e bonachão, que a tirania”.   

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